Coisas que ela deixou

Nos lugares e em mim

laryssa andrade
2 min readApr 29, 2021

cresci muito próxima dos álbuns de fotografia da minha família, mas somente nos últimos anos fui tomada pela vontade de conhecer e escrever sobre histórias que passaram por eles (e por mim). nesse sentido, vovô me mostrou o nome da minha trisavó. conversamos por bastante tempo sobre pessoas que atravessaram a nossa existência.

histórias são coisas que gosto de recriar por meio da imagem e quando me disseram que a minha avó era contadora de memórias, e que muitos gostavam de ouvi-la, bastante coisa se encaixou. foi como se tivéssemos nos encontrado depois de anos. a saudade foi para outro espaço num segundo, voltando em seguida.

minha avó tinha a fala doce. era calma, tinha um jeito próprio de dizer que nos amava. ela nos dava cheiros e orações. ela orava diariamente às 18h. silêncio, pedidos, preces. ela se sentia viva quando se conectava com o céu. quando a perdemos, a sua despedida foi uma espécie de altar para todos que a conheciam. oração, canção, crença, esperança. em mim, a saudade. ela me deu saudade.

ao revisitar os álbuns da família, por mais que ela não esteja em todas as fotos, eu consigo enxergá-la. hoje, com quase doze anos do adeus, consigo enxergá-la em tudo. principalmente nas coisas que ela deixou. a casa tem o cheiro dela, os móveis, o santuário (que está exatamente como ela deixou); e a planta abaixo que, quando nela nasce uma flor, eu entendo o recado vindo de algum lugar encantado dizendo: estou sempre com vocês.

saudade é feito flor. minha avó é o meu antúrio.

autoral | 2021

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laryssa andrade

fotógrafa que escreve cotidianos e outras memórias.